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O novo sítio invisível ecoa o Diário da Peste, Pólen, Colapso e outras paisagens de hoje

Desenho de Daniel Silvestre para a rúbrica Pólen

3 Fevereiro 2021

 

No ar e pelo ar, é no sítio invisível, uma janela aberta no site para a experiência da escuta, que, após o sucesso do primeiro ensaio na Feira do Livro do Porto, a Rádio Estação ocupa morada fixa. A dimensão sonora contraria a tendência da imagem e da experiência de ecrã, acentuada agora nos atuais contextos online que vieram, por força da pandemia, substituir a presença física e, ao mesmo tempo, questionam a prevalência do objeto físico no espaço-museu.

 

A Rádio Estação arranca com um conjunto de rubricas e dá o primeiro passo para uma rede de colaborações em crescimento. As propostas desenvolvidas com os artistas e músicos Tomás Cunha Ferreira e Domenico Lancelotti que criaram de raiz a rubrica Colapso, a colaboração com a Rádio Sonoplasmática, a parceria desenvolvida com a Fonoteca Municipal do Porto Municipal do Porto que nos faz descobrir algumas preciosidades do seu extenso arquivo, ou João Salaviza e Renée Nader Messora com sinais vindos do lado de lá do oceano, são apenas alguns exemplos. Arca, uma nave que percorre as latitudes criativas locais e desafia todos os silêncios, é a proposta da estrutura Matéria Prima, numa das primeiras basilares parcerias.

 

Para ir descobrindo esta rádio—em—construção ao tempo que se desenvolve, espera ao ouvinte uma paisagem em Pólen, captações e composições da cidade e ao redor das estações do museu, uma cúmplice parceria com o Colectivo Espaço Invisível, dirigido por Nuno Preto, com Samuel Martins Coelho, que se estende a outros músicos e artistas sonoros. A partir da 1,00 hora da manhã, em modo notívago, o Fim de Emissão abre campo para projetos de composição autogenerativa, atribuídos periodicamente a um artista. O primeiro segmento estará a cargo de Pedro Augusto.

 

Mas o destaque é para a primeira leitura do Diário da Peste, de Gonçalo M. Tavares que arranca, com periodicidade diária, já hoje às 22H.

Publicados no Expresso durante o primeiro confinamento e de imediato traduzidos para várias línguas, estes textos foram, para o autor, algo de inédito enquanto experiência de “receber o que ia acontecendo e reagindo.” Uma escrita quase em direto, em lista de ideias que querem fixar esse momento irrepetível, toma aqui corpo.

“Foi de uma brutalidade a nível da realidade e da escrita, nunca estive tão próximo verdadeiramente do que estava a acontecer”, confirma Gonçalo M. Tavares, sobre o projeto que ecoa, em exclusivo, na Rádio Estação em pleno segundo confinamento.

Trata-se de um registo pessoal, mas é um documento que espera que ganhe força porque, neste contexto de pandemia, este foi “o primeiro medo que tivemos”.

 

A Rádio Estação acompanha esta reação ao tempo que é o de recontar e de ouvir: “a rádio e a voz permitem um tempo de digestão auricular que tem muito a ver com a capacidade de reflexão”,  justifica o escritor, e importa por isso “recolocar o impacto do som e da palavra na reflexão, em contraponto com um bombardeamento da imagem que muitas vezes também encadeia e imobiliza”.